iStock.com / Mr_Blue69 Desde que a agricultura teve início, há 12 mil anos, o número de árvores no planeta caiu cerca de 46%.

O Fundo das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação – FAO, divulgou no mês de julho passado o relatório “O Estado das Florestas no Mundo – 2016”, afirmando que a produção de matérias-primas agrícolas é a principal força impulsionadora do desmatamento. O relatório destaca que 70% do desmatamento na América Latina entre os anos de 2000 a 2010 está relacionado ao agronegócio com produção voltada, principalmente, aos mercados internacionais, em particular aos países desenvolvidos. Esse desmatamento que beneficia a agricultura comercial converte as florestas em áreas de cultivo e pastagem – das florestas desmatadas no Brasil, 80% são convertidas em pastagens.

Para atender à demanda global de produtos agrícolas são cortadas anualmente cerca de 15 bilhões de árvores, de acordo com cálculos de pesquisadores liderados por Thomas Crowter, do Instituto Holandês de Ecologia, em artigo publicado no número de setembro de 2015, na revista Nature. Nesse estudo, os autores chegaram à conclusão de que atualmente existem cerca de 3 trilhões de árvores, o que equivale a aproximadamente 422 árvores por pessoa no mundo. Desde o início da agricultura há 12 mil anos, o número de árvores no planeta caiu cerca de 46%.

Esses números reforçam a importância delas para a cultura humana, tanto no passado como no presente. As florestas abrigam mais de 60% da biodiversidade, protegem os solos e as bacias hidrográficas. Além do valor ambiental intrínseco, as florestas agregam valores sociais e econômicos importantes que vão desde a comercialização de seus produtos até o sustento de indígenas e diversas comunidades locais. Em termos globais, as florestas desempenham papel fundamental na regulação do clima e são importantes sumidouros de carbono, contribuindo decisivamente para a diminuição do efeito estufa.

O problema é que a maior parte do desmatamento é feita de forma ilegal, envolvendo corrupção, violência, violação de direitos humanos, perda de renda das comunidades locais, entre outros problemas. E a situação tende a se agravar com o crescimento da classe média global, que é acompanhada pelo aumento do consumo para satisfazer suas novas necessidades. Na China, por exemplo, em 1982, cada habitante consumia 13 quilos de carne por ano, com a melhoria do padrão de vida de uma parte da população chinesa e a aquisição de hábitos alimentares ocidentais, atualmente o consumo subiu para 63 quilos por ano/pessoa, perfazendo 28% do total consumido no mundo. Mantendo-se o padrão de crescimento, estima-se que cada chinês irá consumir quase 100 quilos por ano, até 2030.

Segundo estimativas da organização não-governamental (ONG) Forest Trends divulgadas em setembro de 2014, quase 40% de todo azeite de Palma, 20% de toda a soja, quase 33% da madeira tropical e 14% de toda a carne comercializada internacionalmente têm origem em terras que foram desmatadas ilegalmente. Os principais mercados consumidores da matéria-prima originada de terras desmatadas ilegalmente são a União Europeia, a China, a Índia, a Rússia e os Estados Unidos.

Em março de 2015, a ONG FERN (em inglês significa broto de samambaia), que se dedica à proteção das florestas e tem sede em Bruxelas, na Bélgica, divulgou o estudo “Bens roubados: a cumplicidade da EU no desmatamento tropical ilegal”, mostrando que a União Europeia é a maior importadora de mercadorias retiradas de áreas desmatadas ilegalmente. Entre 2010 e 2012, de dois em dois minutos uma área de floresta tropical equivalente a um campo de futebol era ilegalmente destruída para fornecer carne, couro, óleo de palma e soja aos países europeus. A própria União Europeia reconhece que seja responsável por 36% da importação global de produtos associados ao desmatamento nos países de origem. Soja e óleo de palma são as principais mercadorias. Todo o óleo de palma utilizado na União Europeia é importado e 98% da soja importada é utilizada principalmente para alimentar animais e fabricar biodiesel.

O estudo da FERN especifica ainda que os países de origem dos bens agrícolas derivados do desmatamento ilegal são principalmente o Brasil (onde estima que 90% do desmatamento seja ilegal) e a Indonésia (que tem 80% das árvores cortadas ilegalmente).

Os diversos estudos têm em comum explicitar a nossa dependência em relação às florestas e a necessidade de manter sua sustentabilidade como condição de sobrevivência da espécie humana.

Alguns países adotaram medidas para promover o uso sustentável das florestas. São elas: vinculação de incentivos fiscais a metas ambientais, adoção de pagamento por serviços ambientais, recuperação de áreas de pastagens degradadas, plantio de florestas destinadas a atender a demanda por madeira, exigência de certificação de origem dos ingredientes utilizados nos produtos processados. Estas informações devem constar nos rótulos das mercadorias.

Do lado do consumo, há necessidade de melhorar a informação. Há muitas pessoas que adotariam atitudes de consumir produtos de origem conhecida, ignorando aqueles de fonte duvidosa, mas para que isso aconteça necessitam de informação mais detalhada sobre o impacto ambiental dos bens que consomem. A melhor informação sobre a origem dos ingredientes utilizados nos produtos processados contribui para que o consumidor passe da conscientização à ação concreta, pressionando os produtores para que modifiquem e fiscalizem sua cadeia produtiva aumentando seu compromisso com a sustentabilidade.

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Doutor em Ciências Sociais e Mestre em Ciência Política pela UNICAMP. É especialista com pós-graduação em Ciências Ambientais pela USF. Foi professor e coordenador de curso em várias instituições de ensino, entre as quais: Mackenzie/SP, USF/SP, UNIP/SP, UNA/MG. Tem experiência na área de Sociologia, com ênfase em Teoria Sociológica, atuando principalmente nos seguintes temas: Administração, sustentabilidade, política pública, responsabilidade social, gestão ambiental, turismo. Recebeu em 2015 certificado de Menção Honrosa em reconhecimento à excelência da produção científica pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Tem inúmeros livros publicados em sua área de atuação pelas Editoras Atlas, Pearson e Saraiva entre outras.